O barulho do silêncio
Ronaldo
Magella – professor, poeta, escritor, blogueiro, radialista, jornalista e mais
nada
“Nada não”, foi o que você
começou a repetir, no mesmo tom, com a mesma voz, sempre o mesmo olhar,
distante, sem vontade, ocupada consigo mesma, em si, fechada, trancada, sempre
lá, do meu lado, cá, como se um muro, sim, ele existia, aceitava aquelas duas palavras como se elas
quisessem dizer, “está tudo bem, não se preocupe, vai passar, só me deixa aqui
um pouco”, me deixa, um pouco, queria dizer tudo o que não conseguia perceber,
você não queria ser deixada ali um pouco, já não iria passar, não havia mais
retorno, não havia mais algo a ser dito, o silêncio estava cantado com todas as
letras, em sons destoantes, em riffs alucinantes, e dançávamos loucamente sobre
o nosso próprio túmulo, abraçados, morrendo aos poucos sem conseguir nos
salvar, embriagados pelo loucura de ainda estarmos juntos, talvez pela
esperança, mas não sei se acreditava ou
se me enganava se aceitava ou até mesmo queria que assim o fosse, não havia
reação, uma força maior me tomava o impulso, calara a voz, silenciava minhas
reações, como se preso estivesse e não fosse possível dá um passo adiante,
pensava, desgostosamente, que tudo iria ficar bem logo mais, que era um pedaço
de tempo, que era possível de acontecer, éramos casais e isso acontece com
eles, sim, éramos bons, os melhores, a vida iria seguir e a gente melhorar, mas
era bem assim que as coisas estavam em nós, para nós, o silêncio que se tomara
de nós, doía como uma ferida aberta, o som do caminhar, o cheiro do perfume, o
timbre da voz, tudo aquilo nos irritava, já não nos suportávamos, não sentíamos
alegria em viver, de viver ali, e aos poucos não tínhamos mais o que falar,
surdamente ouvíamos o nosso amor, tínhamos gritos de socorro para alardear, e sem
falar, gritávamos, que alguém nos salvasse, por Deus, socorro, pedíamos,
alguém, peço por favor, nos tira daqui, da nossa morte, da nossa dor, do nosso
fim, em vão, queríamos que os outros nos pudessem ver, ouvir, perceber,
chorávamos tanto, sentíamos tanto, cansávamos até para nos confessar,
guardávamos em nós o que de pior sentíamos, e era aos outros que suplicávamos,
pois em nós nada mais restava, já havia sido decretado a falência do que
havíamos sido um dia, éramos silêncio e dor, um som morto, uma luz escura, uma
angústia sem fim, um tempo que se arrastava penante, quando tudo era apenas
vazio, apossando-se, concreto, como uma rocha, bem ali, em meio a nós, era
papável, duro, forte, intenso, mortal, primeiro foi matando o que sentíamos,
depois o que poderia nos salvar, as palavras, enchíamos nossa vida de coisas e
perdíamos a nós mesmos a cada instante. “Sim”, “não”, “pode ser”, “talvez”, hum
rum”, tínhamos sidos expulsos do paraíso, não tínhamos mais dicionários,
livros, revista, voz, som, barulho, palavras, frases, não havia música,
palavrão, raiva ou dor, saudade ou ciúme, tristeza ou mágoa, estávamos
indiferentes das gentes, não nos cabíamos em nós mesmos, de lado agora era
sempre mais interessante, dormir a nossa cura , estar longe o nosso desejo,
voltar o nosso inferno, falar a nossa dor, sorrir nos magoava, quanta dor
muitas vezes há na felicidade e na alegria falsa, em manter as aparências, em
ter que viver o que já se não podia mais, talvez nunca em toda a nossa a ideia
da morte nos acalentava tanto o coração, já estávamos mortos, só queríamos que
alguém nos enterrasse, vivos, nossa dor era a nossa doença, estarmos juntos era
a nossa condenação, o silêncio o nosso pecado, sorrir a nossa maldição.
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